Saturday 15 May 2010

Comunidade

Três, foto de Isabella Lychowski
Comunidade
por Franz Kafka

Somos cinco amigos; uma vez saímos um atrás do outro de uma casa; primeiro veio um e pôs-se junto a entrada, depois veio, ou melhor, dito, deslizou-se tão ligeiramente como se desliza uma bolinha de mercúrio, o segundo e se pôs não distante do primeiro, depois o terceiro, depois o quarto, depois o quinto. Finalmente, estávamos todos de pé, em uma linha. A gente fixou-se em nós e assinalando-se, dizia: os cinco acabam de sair de casa. A partir dessa época vivemos juntos, e teríamos uma existência pacífica se um sexto não viesse sempre a se intrometer.
Não nos faz nada, não nos incomoda o que já é o bastante; por que se introduz por força ali onde não é querido. Não o conhecemos e não queremos aceitá-lo. Nós cinco tão pouco nos conhecíamos antes, e se quer, tampouco nos conhecemos agora, mas aquilo que entre nós cinco é possível e tolerado, não é nem possível e nem tolerado com respeito àquele sexto. Além do mais, somos cinco e não queremos ser convivência permanente, se entre nós cinco tão pouco tem sentido,
mas nós já estamos juntos e continuamos juntos, mas não queremos uma nova união, exatamente em razão de nossas experiências. Mas, como ensinar tudo isso ao sexto, posto que longas explicações implicariam em uma aceitação de nosso círculo? É preferível não explicar nada e não aceitar. Por muito tempo que franza os lábios, afastá-lo, empurrando-o com o cotovelo, mas por mais que o façamos, volta outra vez.


Comunidade, conto de Franz Kakfa, tradução de Torrieri Guimarães. Frankfurt, 1952.

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